Não quero discutir aqui a pergunta que os fãs de esportes (esportes, e não unicamente futebol) discutem ao redor do mundo inteiro: se a Copa do Mundo é mais legal de se acompanhar que os Jogos Olimpícos ou vice-versa. Para mim, a questão é resolvida facilmente: o futebol há muito deixou de ser apenas um esporte, e, por ter dado certo, é o maior evento do planeta. São menos jogos e uma visibilidade imensa, com superlativos que impressionam demais ao falarmos de rendimentos econômicos e de audiência. Mas, se quisermos histórias mais humanas e que não estão no jornal todos os dias, as Olimpíadas são um prato cheio.
.
Em um post inspirado, o twitteiro e blogueiro Ricardo Henriques (conhecido na internet como Calhau) fez um ótimo saldo final do evento de Londres - a postagem pode ser acessada diretamente aqui. O ponto alto do texto, porém, foi a lembrança de alguns personagens com histórias esportivas marcantes, provando que os esportes não tão vistos nesse país tropical rendem histórias tocantes.
.
Começamos com a judoca saudita Wojdan Shaherkhani. Facilmente derrotada na estreia, a adolescente de 16 anos cravou sua história nas Olimpíadas por tornar-se a primeira mulher a representar a Arábia Saudita em Jogos Olimpícos, muito em função de um trabalho para deixar os Jogos mais abrangentes e representativos socialmente do Comitê Olímpico Internacional - aliás, podemos fazer mutias críticas ao COI, mas essa atitude é louvável, ao dialogar com regimes extremamente fechados em prol do esporte.
.
Já Mo Farrah é um somali (apenas lembrando que, como Estado, a Somália vive uma situação tão complexa que nem existe mais) que migrou para a Inglaterra e tornou-se um megacampeão de provas de fundo. Em Londres, ele foi medalhista de ouro nos 5000m e 10000m. Para não esquecer de suas origens, ele tornou-se um grande ativista contra a desnutrição infantil africana, sobretudo em seu país de origem.
.
O queniano Julius Yego aprendeu a lançar dardos observando movimentos de atletas de alto nível no Youtube. Com acurácia, precisão e muito estudo, ele chegou às Olimpíadas. Também não podemos esquecer que um treinador pagou com seu próprio dinheiro quando o único dardo com o qual o africano treinava quebrou-se.
.
A velejadora polonesa Zofia Noceti-Klepacka tem, talvez, a história mais humana e solidária de todos os Jogos. Ela apenas foi para a competição para ganhar uma medalha e leiloá-la em prol de sua vizinha, que tem uma doença extremamente rara e grave. A europeia ficou com a prata, mas não se sabe se ela conseguirá bancar o tratamento de Zuzia - nome da referida vizinha. Seja como for, é um grande exemplo.
.
Até mesmo quem já tem uma carreira consolidade no esporte provoca histórias interessantes. O triatleta canadense Simon Whitfield, que tem um ouro e uma prata olímpicas em seu currículo, caiu e levou consigo o estreante costarriquenho Leonardo Corrales. Ao invés de mostrar irritação ao perder a chance de sua vida de brilhar, o centro-americano escreveu em redes sociais que ele é um de seus maiores exemplos e que espera encontrá-lo nas Olimpíadas do Rio. Espírito olímpico em estado puro.
.
Deficiências físicas podem atrapalhar muitos atletas, mas algumas pessoas são especiais não só por lhe faltar algum pedaço de corpo humano, mas também por seu alto rendimento quando comparados aos que tem um corpo intacto. O sul-africano Oscar Pistorius é a maior prova disso. Especialista em provas de 400m, ele competiu pela primeira vez em competições olímpicas e chamou a atenção do granadino Kirani James, que não comemorou a vitória em sua bateria para ter uma lembrança do Blade Runner. A polonesa Natalia Partyka nasceu sem parte do braço e, mesmo assim, joga tênis de mesa como poucas.
.
A imagem mais marcante dessas Olimpíadas, porém, é a de Shin Lam. A sul-coreana foi prejudicada pelo equipamento de esgrima, que não marcou um ponto seu e marcou um de sua adversária. Ela entrou com um recurso para a mais alta instância olímpica presente e permaneceu no tablado por cerca de uma hora - sair do local de competição implica em desistência automática. O recurso foi negado e a oriental chorou copiosamente, em imagem tocante que foi lembrada até mesmo na cerimônia de encerramento dos Jogos.
.
Como esquecer, também, das nadadores adolescentes que conseguiram resultados tão incríveis ? A chinesa Ye Shiwen venceu duas provas e, em uma delas, foi mais rápida até que os homens em boa parte da competição. A lituana Ruta Meilutyte, de apenas 15 anos, venceu os 100m peito e também entrou pro seleto hall de medalhistas de ouro nos Jogos Olímpicos. E você, sabe-se lá com quantos anos, o que fez de importante hoje ? E você aí, sedentário...
.
Não precisa ser um Phelps ou um Bolt para emocionar. Aliás, a emoção muitas vezes vem desse exército de quase-anônimos que não tem seu nome veiculado, mas por diversas vezes são verdadeiros exemplos de superação.