Venho de uma geração que, mesmo sem querer, tinha um programa agradável nas tardes do último dia do ano. Seja parado em frente à TV, se arrumando para passar o reveillón com os amigos ou com a família ou preparando um banquete em casa, todos viam a São Silvestre. Era uma prova curta que passava por vários pontos turísticos de São Paulo e que tinha, de um jeito ou de outro, um ar de comemoração e retrospectiva do ano que passou.
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Sei que ainda dei azar de pegar essa fase - que, para mim, era muito boa. Minha mãe sempre me fala que São Silvestre legal era a do tempo dela, quando a corrida começava às vésperas do réveillon. Ás vésperas mesmo: com um percurso menor que 7km, a prova começava às 23h30. Era o tempo exato para o primeiro colocado ouvir que venceu a corrida nos primeiros segundos do ano vindouro.
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Essa fase acabou (e a minha fase, das provas à tarde, começou) em 1989, para se adequar a uma série de regras da IAAF - Associação Internacional das Federações de Atletismo, em inglês. Para isso, foi definido o trajeto de 15km e o novo horário das largadas. Muitos reclamam que a prova perdeu o charme - algo que eu discordo. As pessoas que criticavam essa fase vespertina da São Silvestre não imaginavam o verdadeiro estupro que fariam com a prova a partir de 2011.
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Nesse ano, colocaram a chegada da prova na frente do Obelisco do Ibirapuera - retirando-a do tradicional local, na frente da Fundação Cásper Líbero. Ao menos essa mudança nojenta durou apenas um ano.
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Em 2012, entretanto, houve algo tão escroto quanto: a São Silvestre foi jogada para o horário da manhã. O pretexto dado foi o de que correr de manhã era muito mais saudável - prática muito comum em todo o mundo. Mas vale dizer que, nesse "todo mundo" não estão os profissionais - e boa parte de quem corre faz percursos bem menores que os tais 15km, e sem um esforço físico da tão falada subida da Brigadeiro, por exemplo.
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Mas, cá entre nós, todos sabemos que não se liga muito para a saúde do próximo, e sim para os próprios interesses. O que levou a corrida para o período da manhã foi o reveillón na Paulista, que com o passar do tempo foi se tornando um dos grandes eventos do calendário paulistano. A São Silvestre, que se encerrava antes das 18h, em tese prejudicava a festae a chegada dos que lá estavam pelos show e pelas queimas de fogos.
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O reveillon na Paulista começou em 1996, e desse ano até 2011 não ouvi um relato sequer de alguém que sentiu que a São Silvestre prejudicou a festa - assim como não ouvi alguém que sentiu que o reveillon nesses últimos dois anos, com a São Silvestre bem mais cedo. Mesmo assim: a corrida chega em 2014 à sua nonagésima edição. Deveriam ter mais respeito por uma prova iniciada em 1925 e que traz tantas memórias afetivas a quem a vê, principalmente aos paulistas e paulistanos.
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Amanhã acordarei cedo para ver a São Silvestre nesse ingrato horário por ser fã da prova. Mas algo tem que ser feito para recolocá-la em um dos seus horários habituais.