sexta-feira, 20 de julho de 2012
Oi, oi, oi
Avenida Brasil é um fenômeno. Posso dizer que, nos últimos 10 anos, nenhuma novela arrebenta tantos recordes do IBOPE desde o início. Algumas marcaram demais o público nesse período, como Paraíso Tropical, A Favorita e Fina Estampa, mas todas cresceram no IBOPE já no final de suas exibições - em parte graças ao capítulo 100, que é decisivo para a novela.
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Pois bem, o capítulo 100 de Avenida Brasil foi hoje, e registrou mais de 40 pontos de audiência - recorde desde Senhora do Destino, em 2004. E, bem antes dessa noite, a novela já era um estrondoso sucesso.
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A começar pelo tema de abertura. O kuduro, ritmo angolano que chegou com força no Brasil graças a música original de Don Omar e Lucenzo e que ganhou uma versão em português de Latino, emplacou com tudo. A música pouco tem a ver com o restante da história (bem como toda a abertura), mas arrebatou o público desde o começo. Acho que escolher uma música que tenha nexo com o resto da história é algo importante, mas a Globo certamente não tá ligando muito pra isso - uma pena, pois falta a vontade de se fazer algo perfeito, como antigamente.
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Não vejo a novela com frequência, a vejo apenas quando estou com a minha namorada, fã da história. Do pouco que vejo, me impressiono com o abandono total do padrão Globo antigo. Antes, havia pouca gritaria, o ritmo era bem mais lento e as histórias mostravam quadros basicamente só da classe média-alta. Hoje há um festival de gritos, muita coisa acontece em uma cena só e cada vez mais vemos personagens humildes - ainda que com todo o capricho que a Globo sempre deu para suas telenovelas. Os diálogos também mudaram, já que antes eram raros diálogos picantes e ofensivos, e hoje podemos ver boa dose disso em qualquer capítulo.
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Também é interessante ver que o maniqueísmo vai se esfacelando aos poucos. Teoricamente, a vilã seria Carminha (Adriana Esteves) e a mocinha seria Nina (Débora Falabella). Deve ser isso mesmo, sei lá. Mas muita gente adora Carminha e odeia Nina. Isso é um grande trunfo de João Emanuel Carneiro, autor da história. Ele também já tinha feito isso com sucesso em A Favorita, história na qual só ficou claro que a vilã era Flora (Patrícia Pillar) e a mocinha era Donatela (Cláudia Raia) já na reta final. Certamente o autor gostaria de manter o mistério até o final, mas aí entra o pior dos mundos: quem faz a novela não é o autor, é o público.
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A novela é feito pelo autor nas primeiras duas semanas de exibição. Após esse período, a Globo faz testes com telespectadores para identificar o que o público gosta ou não, o que entende ou não, o que vê e o que falta. Esse feedback é passado para o autor, que tem que se virar para deixar tudo mais palpável.
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A prova irrefutável disso é que a estrela da novela, em seu início (ou seja, na época idealizada pelo autor) era Tufão (Murilo Benício), jogador do Flamengo. Ao chamar a atenção para o futebol, o autor queria chegar ao público duma forma bem direta. Mas quem caiu nas graças do povo foi a história entre Carminha e Nina, e também o fogo de Suelen (Ísis Valverde), que fazia a alegria masculina - mais que o próprio Tufão. Relembro também que a Globo pagou um dinheiro imenso para fazer do estádio Parque do Sabiá, em Uberlândia, o Maracanã cenográfico.
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O público certamente se vê em Avenida Brasil. A história, como eu disse, é bem povão. Isso porquê a Record especializou-se em espetacularizar o jeitão povão de ser e passou a incomodar a Globo. A gigante do plim plim, então, devolveu na mesma moeda - e, como mostra a audiência, com maestria.
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As telenovelas são um dos poucos produtos consumidos pelo povo que é, nitidamente, uma via de mão dupla. O público assiste, o autor sabe o feedback e coloca o que eles querem. Mas, para isso, o autor precisa saber o que o povo faz, como faz, o quê faz, quando faz, onde faz. O autor, resumidamente, vê o povo. E a ótica do autor está na novela. Ao ver a novela espalham-se figurinos que viram moda, frases feitas de personagens que tornam-se inesquecíveis e afins. Mais que se ver na TV, a novela induz o povo a fazer o que nela se faz - e cria-se uma bola de neve que explica porquê as novelas nacionais fazem tanto sucesso.
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Último ponto que eu gostaria de tocar: não vejo novela, mas não tenho nada contra quem vê. Acho que é algo interessante para conhecermos um pouco mais sobre a sociedade vigente - e tudo que aparece nesse aspecto é algo válido. Mas falar apenas de um assunto é, além de chato, um desperdício - não só por só saber falar de uma só coisa, mas também porque existem vários outros assuntos bons para se discutir. Seja novela, futebol, religião ou política, não podemos virar especialistas em um assunto e boçais nos demais. E aí entra a minha preocupação: vejo muitas pessoas tão fascinadas em Avenida Brasil que desaprenderam a conversar sobre outros temas. Além da novela, saiba que as universidades federais estão em greve há dois meses, e isso não passa na TV. Cada um deve fazer o que bem quer na hora do lazer, mas não podemos ter apenas horas de lazer.
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Vamos ouvir muito kuduro até a novela acabar, amigos.
2 Comentários
2 comentários :
- Ana Luisa Manciola disse...
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Texto muito bom, Will!
Gostei de você ter citado a greve das federais, já que é um assunto que tem sido abafado pela mídia. Por sinal, no mesmo dia em que a novela chegava ao seu 100º capítulo, chegava ao 100º dia a greve dos professores da rede estadual da Bahia.
Não assistia às novelas mas essa está realmente muito boa! - 20 de julho de 2012 às 01:32
- Willian Ferreira disse...
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Agradecido, Graviola!
Os professores demoraram, mas enfim, se revoltaram. Não dá pra ter um descaso tão grande com quem forma o futuro do país e deveria ser muito melhor remunerado. Quem paga o pato não é o governo, infelizmente, são os que estudaram pra cacete pra entrar. :(
E, bem, sobre a novela... acho que tem gritaria demais, mas enfim... HAHAHAH - 21 de julho de 2012 às 11:49
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