sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Pinheirinho

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Para os revolucionários, é um sonho: uma imensa área improdutiva que pertence a empresários que repentinamente é ocupada por pessoas carentes que a usam como moradia, ainda que singelas. Para os reacionários, idem: a reintegração de posse que ocorreu recentemente no Vale do Paraíba mostra o quão a polícia tem o poder e o quanto a propriedade tem e deve ser respeitada.
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Uma região que era esquecida e, repentinamente, ganhou destaque por seu status quo. O Pinheirinho é, por definição, uma área que cai como uma luva para acaloradas discussões acerca da situação política, social, cultural e econômica do Brasil do século XXI.
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Resumidamente, a área do Pinheirinho foi ocupada há cerca de seis anos átras, por pessoas humildes - muitas delas ligadas ao Movimento dos Sem-Terra. A ocupação não teve grande destaque na mídia como a desocupação, porém. O Judiciário impediu a reintegração da área, mas a Polícia Militar, com o aval do Executivo, entraram no latifúndio. A ação deixou dezenas de feridos e cerca de dez mortos, segundo o que é veiculado.
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Aqui entra a discussão entre o que está na lei e o que é justo. Antes de mais nada, o conceito de justiça é relativo demais, e lembro sempre que o que aqui está escrito cabe ao autor desse texto. Lembro-lhes também que, como qualquer pessoa, conscientemente ou não, tenho minhas convicções políticas e socioeconômicas, e não quero influenciar ninguém, apenas expor o que penso.
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Pela lei, qualquer tipo de invasão a qualquer propriedade é considerado crime. Mas, cá entre nós... é uma multidão de pessoas que sequer tem onde morar, e a área não produz nada. Ao meu ver, se estivéssemos num país minimamente justo o descampado seria distribuído para pessoas que não tem um lar. Vale dizer que essas pessoas não dispõem de muito dinheiro, e graças à especulação imobiliária, nem sonham com uma casa própria ou alugada. Especulação imobiliária que é favorecida por grandes áreas improdutivas sem uso e sem ninguém para ocupá-la, exatamente o caso de Pinheirinho. Invadi-la, então, seria acabar com o motivo da situação ruim. Seria perfeito.
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Seria. Não é legal ter algo e ver isso ser tomado, seja da forma que for, por mais justo que seja. E quem usa esse argumento está certo também, queira ou não - até pela lei possibilitar isso.
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O problema, ao menos para mim, reside no fato da constituição permitir que alguém enriqueça à base de algo que pode ajudar outros e torna-os miseráveis. Tô longe de ser socialista, mas o mínimo que um país precisa fazer para se considerar justo socialmente é fazer uma reforma agrária. O México, por exemplo, está longe de ser um país socialista e fez sua reforma agrária há um século. Também é hora desse temor da classe média acabar: se a sua terra for produtiva, nada acontecerá com ela. Não virão comunistas barbudos fedendo vodka colocar uma foice na sua cara. Isso é ilusão e alienação. Isso, claro, se tudo acontecer como deve acontecer, mas isso no Brasil é raro.
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Sobre a reintegração de posse, alguns adendos. Essa expressão quase sempre é usada como eufemismo para selvageria e barbárie contra quem não pode lutar com as mesmas condições. Falaram mal do "armamento" dos acampados no Pinheirinho, mas esquecem-se que as armas dos carentes eram paus, pedras e escudos frágeis. A PM usou bombas, balas e cacetetes. Há algum tipo de comparação ? E... ah, a PM. Não dá pra deixar batido o fato de ser a PM, a qual eu não consigo mais chamar de polícia. Ela nunca me fez mal, talvez por ser branco e ter boa condição social, mas tenho ojeriza do que ela faz contra quem tem mais cor e menos dinheiro que eu. Infelizmente, a PM hoje é uma Guarda Reacionária, uma Legião do PSDB, que defende apenas o que é de interesse do governo paulista.
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Olhando pelo outro lado, faço uma ressalva. Como disse anteriormente, muitos dos ocupantes do Pinheirinho tem alguma ligação com o Movimento dos Sem-Terra e outras organizações semelhantes. Ou seja, eles não são santos, também. O MST é o berço de figuras controversas (para não falar mais) como João Pedro Stédile e José Rainha Junior. O movimento e essas pessoas citadas podem até ter princípios bons, mas já cometeram muitos erros na vida, convenhamos.
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Como tudo na vida, há vários pontos que circundam o que acontece em Pinheirinho. O que não podemos é tomar apenas um lado como verdade, e também não podemos discutir de maneira superficial, sem ouvir o outro lado. Mas, caso haja uma discussão profunda, podemos ter grandes avanços em áreas hoje carentes de discussão e enfoque na sociedade. Cabe a nós sermos maduros e conscientes o suficiente para entender que Pinheirinho não trata-se duma luta ideológica entre direita e esquerda. Trata-se de justiça, de igualdade, de dignidade e respeito ao próximo.
Comentários
1 Comentários

Um comentário :

Lari Reis disse...

Gosto muito da sua forma de pensar e de destrinchar os fatos.
Eu tenho sido muito sucinta ultimamente e o caso de Pinheirinho entra em uma das questões que eu gosto de colocar na categoria "um erro não justifica o outro". Apesar de todas as dificuldades que envolvem a ocupação, a desocupação não foi legal.