A menos que você viveu em Urano em 2014, você certamente teve conhecimento da grave crise hídrica que assolou boa parte do Brasil em 2014. A seca atingiu mais fortemente São Paulo, que passou a acompanhar os níveis dos seus reservatórios de água (sobretudo o Cantareira, que atende 8,8 milhões de pessoas) atentamente. A porcentagem de água era dada no rádio e na TV como os índices da BOVESPA ou a temperatura máxima e mínima da previsão do tempo.
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Mais: os paulistas aprenderam que existe um nível d'água que só entra em ação em situações de emergência: o chamado volume morto. Hoje em dia ele é contabilizado para se chegar à capacidade atual dos reservatórias - tão ruim é o nível que chegamos.
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O governador Geraldo Alckmin atribuiu a crise à falta de chuvas, paliativamente - e ridiculamente. Como esperado por quem não quis se enganar, ele mudou a versão após a eleição que garantiu sua reeleição como governador. Não precisaria mostrar o quanto ele estava errado em sua avaliação, mas lá vai: nem mesmo as tão conhecidas e torrenciais chuvas de Verão (que alagam uma série de bairros paulistanos e cidades vizinhas à capital) foram capazes de elevar o nível dos reservatórios. Pelo contrário: eles caíram ainda mais desde então.
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A parcela de culpa de Alckmin está no fato de que ele foi avisado sobre a situação periclitante na qual o sistema hídrico paulista estava e não tomou nenhuma providência, se omitindo. Errado, não tenha dúvida. E ele culpado quanto a isso, não tenha dúvida. Mas isso foi apenas a ponta do iceberg.
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O verdadeiro culpado não é Alckmin, Serra, Lembo (lembra dele?) ou Covas; nem de Haddad, Kassab, Marta Suplicy, Pitta ou Maluf. Dos citados, todos tem o seu quinhão de culpa, é muito verdade. Mas os problemas são muito (deixe-me sublinhar o muito) anteriores. Vem da própria formação da cidade de São Paulo.
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A ~Locomotiva do Brasil~ só passou a honrar essa alcunha na virada do século XIX para o século XX. Em 1890, a cidade tinha 64.934 segundo o CENSO da época; dez anos depois, já tinha 239.620 - um aumento de 269% em uma década. Mais: até 1940, a população cresceu mais 260%, enquanto a população de 1950 era dez vezes maior que a de 1900 - em meia década, apenas. Um ritmo de crescimento demográfico desses faria Malthus ser considerado um profeta.
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Não há sistema social que resista a esses números. Aliás, é difícil dizer se houve algum dia algum sistema social decente em São Paulo - e no Brasil. O reflexo desse boom populacional é óbvio: vai faltar tudo (e água é apenas um desses itens) e a população vai sofrer.
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Para os políticos, mais importante que garantir algumas reformas estruturais vitais para uma cidade que agoniza aos poucos é pensar em eleições e no custo que mudanças bruscas (e necessárias) terão nas urnas. Se protestamos pelos preços abusivos pagos no transporte público, temos temas tão importantes quanto para exigir alguma mudança de política pública urgentemente.
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Temos, inclusive, um ótimo exemplo para seguir. Quem pensa hoje em Barcelona pensa em um ótimo lugar para se viver, com muita história e pontos turísticos. Até bem pouco tempo atrás era bem diferente, com problemas bem semelhantes ao de São Paulo. O ponto para a mudança catalã se deu em 1992, com as Olimpíadas na cidade. O programa de reformas urbanas iniciado na década de 1970 se acelerou e, hoje, a cidade Gaudí é referência em qualidade de vida.
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Há muito a ser feito e já temos motivos mais do que suficientes para ver que São Paulo pede socorro. Atenderemos?