Vejo muita gente (pra não dizer todos) dizendo que a liberdade de expressão foi atacada no terrível atentado terrorista à sede da revista Charlie Hebdo. Fico um tanto quanto chocado por discordar de tanta gente intelectual (e assumo minha pouca inteligência), mas não acho que o ponto nevrálgico dessa discussão seja esse.
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Ao meu ver, a liberdade de expressão (e sua antítese, a censura) são características de Estado. O atentado que vimos não foi diferente de outros tantos que acontecem às pencas em outras diversas áreas do mundo - muitas das quais não são mostradas pela grande mídia. A diferença fundamental é que foi contra um veículo da imprensa. E esse é um dos lados negativos do corporativismo jornalístico: se foi um ataque em uma redação é um atentado contra algo muito maior que algumas pessoas; se foi em algum rincão qualquer contra indigentes (por exemplo), nem precisa ser noticiado.
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O jornal, símbolo da mídia como um todo, apenas representou o principal (ou um dos principais) inimigos da religião, segundo os terroristas. Se fosse alguma outra entidade, eles a atacariam - como fez Mehmet Agca, que tentou matar o papa João Paulo II em 1981.
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A mais trivial delas é a irracionalidade. Ao praticar o ato terrorista, tenho certeza que os homens sabiam que estavam criando heróis modernos na luta contra diversas ideias que temos hoje em dia no Ocidente. E nem isso foi capaz de detê-los. Eles aumentaram a aversão de muitos a uma religião e a um grupo étnico que já sofre com diversas formas de preconceito. Eles agem apenas por si, não pensando em seus semelhantes. E isso me leva ao segundo ponto, esse muito mais crítico - pensando que a irracionalidade é de um ínfimo grupo, obviamente.
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Nada me parece mais em alta no mundo nos tempos atuais que a intolerância e as fobias. Antes ela obviamente já existia, mas contra minorias - e já era nojenta. Hoje ela não se restringe: tudo é motivo para matar, torturar, assassinar e fazer coisas nojentas contra outras pessoas. À crítica se responde com violência. Esse é o mundo que queremos?
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Também vale lembrar que a questão islâmica na França é ainda mais delicada. Como principal colonizador de países do norte da África, os gauleses recebem uma série de marroquinos, argelinos, congoleses e gente de outras tantas nacionalidades que apenas buscam uma vida melhor - terroristas, novamente, são uma parcela irrisória desses imigrantes.
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Temos muito o que aprender em matéria de cidadania e sociabilidade ainda. Nos resta apenas lamentar, mais uma vez, um atentado tão chocante e intolerante - e torcer para que seja o último.