terça-feira, 29 de março de 2011

A morte do guerreiro

>
Não há outra palavra pra designar José Alencar. Não falo duma história piegas, mesmo sendo bonita, do homem de classe média-baixa que foi galgando o sucesso e venceu na vida como poucos. Falo dum estilo batalhador que luta por algo que dá a vida, e faz da vida algo com nuances mais fortes e belas: sua saúde, sua superação, sua forma de lidar com tudo isso.
.
Lutar contra qualquer coisa durante treze anos é algo difícil. Lutar contra um câncer nesse tempo é algo impensável pra maioria. Quanto mais, então, fazer dezessete cirurgias, uma a cada nove meses, contra essa doença demoníaca e implacável. Ele resistiu. Descobriu o tumor, o viu aumentar, viu um novo tumor nascer em 2006, fez uma cirurgia de incríveis catorze horas nas quais a nação toda estremeceu, torcendo pelas três equipes médicas que se revezaram pra conter o câncer e... ele resistiu. Com, então, nove anos na luta, ele passava pelo momento no qual a nação já preparava-se pro pior.
.
Especulava-se também se ele aguentaria quatro anos do primeiro mandato de Lula. Aguentou. Um segundo é inviável, diziam. Ele mostrou que todos que dele falaram não sabiam da guerra do bem que ele travava contra seu próprio corpo. Na transição entre os governos Lula e Dilma, ficou no hospital à contragosto. Por ele, iria. Os médicos e sua mulher proibiram. Seria um sinal ruim se ele não despachasse da UTI hospitalar, mostrando uma vontade de trabalhar e um exemplo invejável para uma corja de políticos tão escrota quanto a desse país.
.
Hoje ele se foi. Sabíamos que uma hora ela viria, e essa hora, mesmo sendo sempre tão bem prolongada por um corpo ávido por vida, chegaria rapidamente. Mesmo diante dum quadro clínico e dum histórico de saúde tão complicado, sua morte pegou a todos de surpresa. Imagina o que é falar para uma família que o paciente será sedado pois não há nada o que fazer. O paciente, na linguagem tão fria dos médicos, significa um pai, um marido, um avô, que terá seus últimos momentos desacordado para não sofrer e por não ter mais o que fazer. A hora chegou.
.
E a minha crença na imortalidade, fica aonde ? Junto com o maior imortal que conheci, ela se foi. Imortal por ser o maior guerreiro que acompanhei, um raçudo tranquilo e sorridente que escondia por trás de sua aparente alegria dores descomunais e uma crença inabalável na vida, ainda que delicada.
.
Você mesmo dizia que o homem honrado não morre nunca, Zé. Você não morreu hoje, nem morrerá jamais. Obrigado por sua verdadeira lição de vida, de luta, de garra, de superação, da guerra que todos devemos travar contra nossos próprios limites.
.
" O homem deve viver preparado para morrer a qualquer instante, e deve proceder como se não fosse morrer nunca. "
José Alencar
Comentários
0 Comentários

Nenhum comentário :