segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Os empresários devem sumir do futebol

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Dudu, um atacante veloz e habilidoso que atuou em bom nível em 2014 no Grêmio, virou uma das contratações mais desejadas pelos clubes brasileiros em 2015. Por si só isso já mostra a situação ruim na qual o futebol brasileiro está - mesmo bom jogador, Dudu passa longe de ser craque. 
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Disputado principalmente por São Paulo e Corinthians, o atleta foi para o Palmeiras. A transferência causou estranheza, já que o time alviverde tem vivido uma política de grande austeridade econômica nos últimos anos. O clube contratou vários jogadores nessa janela de transferência, o que indica que está melhor financeiramente - ao contrário do rival alvinegro, que tem situação econômica complicada
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O que quero aqui não é discutir finanças no futebol, mas algo praticamente correlato: a influência dos empresários no futebol. O caso de Dudu mostra bem essa situação: o Corinthians negociava com os empresários do atleta e o São Paulo com o Dínamo de Kiev - antigo clube do jogador. Dudu já tinha dito que preferia atuar no Corinthians, e com o fracasso das negociações, a OTB Sports (grupo de empresários do jogador) mandou seu próprio cliente atuar em um dos maiores rivais do clube em que desejaria jogar.
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O futebol não é o mercado de negócios, da mesma forma que clubes não são empresas. Por mais que seja necessário modernizar os tais clubes, não se pode dirigi-los como firmas que almejam o lucro - o futebol exige vitórias, o que não é sinônimo de dinheiro. 
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Aqui começa a minha bronca com os atuais empresários ligados ao esporte. Por mais que dinheiro seja algo de fato muito importante, ela não pode ser tudo. A vontade do atleta tem que ser colocada na balança para definir algo tão importante quanto o futuro de um jogador - que, ainda por cima, é seu cliente e pode encerrar o vínculo com você quando bem entender. Será que a vontade de Dudu era algo tão efêmera e/ou fraca? Ou será que os empresários fizeram a cabeça de um atleta que deve ter vindo de uma família carente e tem instrução e escolaridade limitada, dando a enteder para ele que dinheiro é tudo na vida? 
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Ela falou em tom jocoso sobre todas as insistentes tentativas que o São Paulo tentou para contratar o atleta. Vale dizer que o atacante atua pelos lados do campo e é veloz e habilidoso, perfil que é prioridade na equipe segundo o técnico Muricy Ramalho. Ser ironizado por tentar fazer a vontade de seu próprio treinador e por entrar em contato diretamente com o clube do atleta indicam que, apesar de decisões contestáveis nos últimos meses, a diretoria tricolor segui fiel aos seus princípios nesse caso. 
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Por fim, a desastrosa nota ainda fala de um certo ~apequenamento~ do Corinthians. Os empresários confirmam não saber nada de futebol. Falta de dinheiro é tudo para eles, mas não é assim esportivamente. Para a OTB, o time que está na Copa Libertadores de 2015 e foi campeão mundial recentemente está se apequenando, enquanto um clube que não foi rebaixado apenas por incompetência alheia (isso sem falar nos dois rebaixamentos em dez anos) e soma apenas um título nacional nesse milênio é o melhor destino para o atleta. Vai entender. 
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O mais triste é imaginar que Osvaldo (do São Paulo) e Paolo Guerrero e Edilson (do Corinthians), tem vínculos com a mesma OTB Sports. É ruim para eles, que veem suas carreiras nas mãos de pessoas que nada sabem do riscado; e também para os clubes, que ficam de mãos atadas em conversas com o grupo de empresários. Mais: Edilson chegou ao Corinthians há poucos dias. Parece que o tal ~apequenamento~ do clube não impediu essa transação, já que o alvinegro tinha dinheiro para fazer o negócio - bem mais em conta. 
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Óbvio que existem empresários que fazem um bom trabalho. Mas a essência do trabalho deles no futebol é muitas vezes confundida com a agiotagem de determinados profissionais que são incapazes de fazer qualquer plano de carreira ou de marketing para o atleta, buscando apenas a maior quantidade de dinheiro no momento. 
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Uma das poucas atitudes boas que a FIFA tomou recentemente foi a proibição de fundos de investimento no esporte. É claro que vão tentar burlar essa regra e é claro que há o risco dela não pegar, mas é algo que eu particularmente acho necessário. O Brasil tentou dar mais liberdade para os atletas nas negociações por meio da Lei Pelé, mas os clubes são sacrificados - e os atletas também, embora não percebam. Tanto é assim que a Premier League, um show em formato de liga nacional de futebol, proíbe o mercado escravo-futebolista de atletas - isso começou, aliás, após a venda de Carlos Tévez e Javier Mascherano do Corinthians para o West Ham via MSI e Kia Joorabchian, nomes bem conhecidos dos torcedores brasileiros e exemplares no tocante ao quanto maléficos são os efeitos desse grupo de pessoas no futebol. 
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Falei aqui apenas de casos conhecidos, mas existem milhares de outras situações ainda piores que não são noticiadas. Uma das prioridades de Carlos Miguel Aidar, eleito presidente do São Paulo em 2014 após mandato na década de 1980, é acabar com o balcão de empresários que tinha se tornado o CT de Cotia - usado pelas categorias de base do clube. Vale dizer que há mais de trinta anos ele luta pela modernização do futebol. Ou seja: se os empresários agem nas categorias de base dos clubes, fisgando meninos de 12 anos que devem primeiro tomar consciência de seu papel na sociedade para depois pensar em sua formação esportiva e acadêmica, existem dramas muito maiores que os relatados por mim e pela mídia. 
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Não achem que isso é choro de perdedor, palmeirenses. Vocês mesmos sempre reclamaram da postura de intermediários em negociações - os casos de Wesley e Thiago Mendes são os mais lembrados recentemente. Os torcedores de todos os clubes precisam deixar a rivalidade de lado e entender que certas bandeiras devem ser empunhadas por todos para o bem do futebol, para que o esporte e para que os próprios clubes e as próprias rivalidades sigam existindo. 
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