sábado, 28 de julho de 2012

Quase sem clichês, a histórica festa de Londres

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Normalmente, festas de abertura de grandes eventos esportivos narram a história do país-sede da competição. Em algumas horas resume-se milênios, o que deixa a todos desorientados e sem muita vontade de acompanhar a festa em questão. Nas Olimpíadas de 2008, Pequim mudou essa sina. A ordem da festa era uma só: mostrar ao mundo o quanto a China era forte e próspera - e o quanto os demais países teriam que engolir os costumes e a força do país do dragão vermelho. 
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Coube à China começar a mudar isso, mas a festa que se viu hoje em Londres foi um verdadeiro show. Na Inglaterra, a ordem era outra, totalmente diferente: mostrar o quanto a Inglaterra foi importante para construir o mundo no qual vivemos hoje - ainda que ele esteja em constante mutação. Sem dinheiro para fazer o desbunde técnico-estético oriental, os ingleses apostaram na simplicidade e em efeitos de fácil assimilação para o público.
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Londres também teve a seu favor o conhecimento que o mundo já tem de sua história. Foi muito mais fácil identificar a Revolução Industrial que várias dinastias chinesas que, infelizmente, os ocidentais pouco tem conhecimento - me incluo nessa lista, desafortunadamente. Mal comparando, Londres foi a escola de samba sem dinheiro que apostou em um desfile leve e pra empolgar o público, enquanto a China veio com um enredo complicado, mas uma estética deslumbrante. Londres foi Salgueiro, União da Ilha. Pequim foi Imperatriz Leopoldinense, Beija-Flor.
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Começando pelos poucos clichês londrinos: o acendimento da tocha, feito por diversos atletas britânicos, foi lindíssimo, mas me decepcionou. Em uma cerimônia que se notabilizou por não ter nenhuma preferência a escolher, faltou mais ambição de entrar para história e sobrou vontade de se fazer algo bonito.
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Outro clichê: o desfile das delegações. Aqui eu concordo que não há muito o que fazer, por ser algo muito tradicional e engessado - e chato. Confesso que me surpreendi com os apupos que as delegações irlandesa, holandesa, indiana e brasileira receberam. Também achei demais ver a presidente Dilma Roussef e sua filha aplaudindo de pé os guerreiros olímpicos brasileiros e sendo focalizada para o mundo inteiro ver nitidamente emocionada. 
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Mas surpresa mesmo foi ver a saudações anglo-saxã a duas delegações específicas. A França, eterna rival da Inglaterra, recebeu calorosas palmas. Já os norte-americanos, colônia que já deu muita dor de cabeça para os britânicos, também foi muito saudada. E vale lembrar a recusa yankee de não abaixar sua bandeira ante a rainha Elizabeth II. 
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Falando na rainha, começo por ela a falar do que positivamente me surpreendeu. A coragem da monarca em dar a cara a tapa e dar um ar descontraído para a tão tradicional (e até certo ponto blasé) família real britânica é louvável. Tudo isso para o bem da festa, dos Jogos, de seu próprio povo e país. Achei fascinante a atitude de Elizabeth II de topar protagonizar uma sequência junto com o atual James Bond, Daniel Craig - que simulou até um salto de pára-quedas de Elizabeth. 
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O destaque dado para a cultura britânica (e em como essa moldou toda a cultura pop mundial) também foi incrível. Esse lado da festa começou já no staff, que teve como diretor o cineasta Danny Boyle. Nos cinemas, além do James Bond já citado, também tivemos um referência monumental ao filme Carruagens de Fogo - falaremos do ponto alto da festa mais tarde.
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A literatura também teve força na festa, com a saga Harry Potter, de J.K. Rowling, tendo papel de destaque. Na área dos livros, também sobraram muitas referências infantis - os britânicos tem como tradição (tudo na Inglaterra é tradicional, já repararam ?) educar as crianças por meio de contos e histórias. Essa preocupação, na realidade, é social, já que o sistema de saúde londrino foi homenageado - uma área tão importante e que eu nunca tinha visto uma homenagem sequer. 
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Como todos sabem, minhas duas grandes paixões culturais são os livros e as músicas. A sonoridade britânica, inclusive, sempre me chamou a atenção duma maneira especial, com diversos gênios e bandas tocantes. A festa me satisfez bastante ao mostrar vários momentos e bandas marcantes, dos Beatles até os dias atuais - sempre contextualizando com a situação mundial como um todo. 
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Os shows também foram fenomenais, com destaque para duas apresentações: Arctic Monkeys (por mais que a versão da banda para o clássico Come Together, dos Beatles, ficasse um pouco aquém do esperado), apesar da setlist fraca perto de algumas outras músicas da banda; e Paul McCartney, claro. Paul carrega consigo o fardo da história dos Beatles, e cada vez que ele toca Hey Jude para uma multidão de pessoas é como se a história estivesse sendo reescrita. A apresentação, que encerrou a grande festa, mais uma vez comprovou essa tese. 
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O ponto alto de toda a festa, porém, foi Rowan Atkinson. Pelo nome talvez você não o conheça, mas certamente reconhece seu personagem: Mr. Bean. Ele apareceu fazendo a base na canção-tema do já citado filme Carruagens de Fogo, música que é tida como grande representação olímpica. Enquanto apertava uma única tecla ele mostrava-se entediado, tirando fotos do celular, tentando pegar sua mochila e pressionando o teclado até mesmo com um guarda-chuva. Ao final de sua majestosa aparição, ele ainda sonhou que estava vencendo uma corrida olímpica, mas, na realidade, atrapalhava todo o conjunto da música. Impagável. 
Que os Jogos Olímpicos mantenham o nível muito acima da média que a festa de abertura obteve. 
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