Muitos, erroneamente, associam o futebol às condições ecônomicas dum país. Levam em conta renda per capita e taxa de analfabetismo falando sobre as chances de cada seleção na Copa do Mundo. Algumas vezes eles tem razão, claro. Seria fácil demais pros países desenvolvidos levar a partida ante os pobres e ruins ( no futebol e na qualidade de vida ) países do terceiro mundo.
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No entanto, essas mesmas pessoas esquecem-se do mais importante fator de emoção no esporte: a imprevisibilidade. Não lembram que futebol não é tribunal, no qual nem sempre o melhor vence. Já diria um dos mais famosos chavões do esporte bretão, o futebol é uma caixinha de surpresas. Todos já ouviram tal frase, famosa e dita aos 4 ventos por qualquer um que trabalhe, goste ou apenas acompanhe a mais amada atividade física do planeta.
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Duas partidas colocaram frente a frente dois países com índices econômicos ruins, mas com muito valor, e duas nações de forte representatividade no planeta, que entraram como favoritas ( não por isso pra mim, mas só por isso pra muitos ). O primeiro embate deu-se entre Uruguai, a eterna Celeste Olímpica e a Coreia do Sul, dos locais com o futebol mais crescente no mundo. O país americano, chamado de " Suíça das Américas " outrora graças ao seu charme e encanto, hoje amarga uma recessão econômica, perdendo espaço para seus vizinhos Brasil e Chile. A Coreia do Sul viu seu PIB inflar vertiginosamente após a Segunda Guerra Mundial, puxando a fila dos países alcunhados de " Tigres Asiáticos ".
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Em IDH não teria graça. E, pra muitos, a renda per capita se faria valer durante o jogo. Ainda mais após Park Chu carimbar a trave sul-americana logo aos 3 minutos. Num início de jogo movimentado, Forlán cruzou da esquerda e contou com o erro do goleiro coreano Jung Sung, que deixou a bola passar, sobrando limpa pra Suárez marcar o primeiro gol da partida. A Coreia do Sul saiu ao ataque, e o Uruguai passou a se defender com suas forças, indo ao ataque apenas ao enxergar um espaço vazio no gramado.Numa dessas, Maxi Pereira adentra a área e chuta, mas Ki Sung corta com a mão, em pênalti não marcado pelo juiz Wolfgang Stark. O primeiro tempo termina com saldo positivo pros pobres.
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O segundo tempo era um espelho do que havia sido grande parte do primeiro: Coreia pressionando, celeste contra-atacando. Com 23, Lee Chung aproveita a péssima saída do goleiro Muslera e faz de cabeça. Os papeis se invertem radicalmente: os coreanos são engolidos pela sede de vitória uruguaia e por sua superioridade técnica. A blitz, enfim, deu resultado após Suárez, agora artilheiro da Copa com 3 gols, aproveitar rebote na área e chutar de direita, no cantinho, indefensável. A bola explode na trave, mas os deuses do futebol ajudam os golaços, os artilheiros e os melhores, quando necessário. O 2x1 classificou os pobres, aguerridos e desacreditados. A nada pobre Celeste Olímpica reescreve sua história: após 40 anos, está de volta a uma quartas-de-final de Mundiais. Como é bom ver esses " pobres ", eternos vencedores, vencendo de novo.
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Uma das maiores disparidades econômicas do planeta entrou em campo pouco depois, em Rustemburgo. A partida reuniria os Estados unidos, maior potência econômica do planeta, contra Gana, detentora de um dos 20 piores PIBs da Terra. Confesso-lhes que, nesse jogo, achava os yankees favoritos. Mas por apresentar um elenco mais equilibrado, experiente e decsivo. Logo no início da partida os Estrelas Negras me calaram com o gol relâmpago de Boateng. O ganês chutou forte e venceu o excelente goleiro Tim Howard. E os africanos quase fizeram 2x0 com Gyan batendo falta. Aos 30 minutos ainda da primeira parte, o técnico norte-americano resolve mexer em sua equipe, colocando o meio-campista Edu. A alteração surtiu efeito, e quatro minutos depois os Estados Unidos chegaram perto de empatar com Findley.
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No intervalo, o carioca Feilhaber entrou na seleção americana. Muito ativo e criando boas jogadas, colaborou ainda mais para o domínio da seleção branca nos 45 minutos finais de jogo. Aos 17 minutos, Mensah faz pênalti em Dempsey. O camisa 10 e estrela do futebol da CONCACAF, Landon Donovan, cobra aberto, tirando de Kingson e quase chutando pra fora, mas a pelota explode na trave entra. Até o fim da partida via-se os africanos na defesa e os americanos a virada à todo custo. Porém, a partida foi mesmo pra prorrogação.
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Esperava-se domínio norte-americano, pois a equipe da África parecia cansada. Ledo engano, novamente. Após longo lançamento de Ayew, Gyan vence o marcador na corrida e fuzila, marcando 2x1. A aguerrida seleção do Tio Sam vai destemidamente ao ataque, chegando por diversas vezes perto de seu objetivo. No lance-símbolo da entrega de cada um dos 11 guerreiros do time, Howard subiu pra cabecear a bola na área adversária, mas Kingson deu um soco forte, isolando-a. Os pobres, ou no caso muito pobres, venceram os ricos, os muito ricos, novamente. Dessa vez sim, de forma muito surpreendentes. Um jogo de superlativos, como notaram em minhas palavras. Faltaram duas observações, dadas sob a forma de curiosidade: a seleção mais vibrante, unida e emocionada da Copa foi eliminada, e a detentora de um dos uniformes mais feios desse mundial ( usado hoje, aliás ), está classificado. O time de Gana 2010 entra pra história por se tornar a terceira seleção africana a se tornar quadrifinalista, juntando-se a Camarões 90 e Senegal 02. A Copa é da África, mais do que nunca.