Demorou, mas a hegemonia argentino-brasileira no continente sul-americano parece ter chegado ao fim. Na Copa América com a menor média de gols da história, o coletivo se sobrepôs aos talentos individuais, e os projetos longos desbancaram a técnica. Tudo isso fez dos times que tinham os técnicos a mais tempo no comando finalistas ante as seleções que normalmente se destacam na Copa América.
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Como toda Copa América, a organização do torneio preferiu sediar as partidas em cidades grandes, sem repetir estádios em mais de uma cidade. O problema é que a Argentina tem seus maiores clubes em Buenos Aires e em seus arredores, sendo raros clubes fortes fora da área metropolitana da capital. O comitê organizador deixou Buenos Aires apenas para a final da competição - e, graças aos incidentes devido ao rebaixamento do River Plate, quase que nem a final foi disputada lá, o que deixou a cidade de La Plata ( capital da província de Buenos Aires, logo, próxima da capital federal, que constituiu uma província de uma cidade só, na hierarquia urbana argentina ) como sede dos jogos mais importantes. A minha maior surpresa foi ver que a cidade de Rosário, de dois clubes fortes ( Newell's e Central ) ficou de fora da escola das cidades-sede. As cidades escolhidas foram Mendoza ( casa do Godoy Cruz ), Córdoba ( do Talleres e do Belgrano ), San Juán ( do San Martín ) e as surpresas Salta e Jujuy, que tem clubes de menor expressão e nem são tão importantes no contexto econômico para o país.
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No grupo A ficaram Argentina, Bolívia, Colômbia e uma das seleções convidadas, a Costa Rica, que mandou uma equipe recheada de jogadores da base. No jogo de abertura da Copa, entre Argentina e Bolívia, um decepcionante empate dos anfitriões por 1x1 contra uma seleção fraquíssima, que não ganha na competição desde 1997. Já a Colômbia, mesmo jogando abaixo do que dela se esperava, fez 1x0 na Costa Rica, o suficiente pra fazer dela líder do grupo até o fim da primeira rodada, deixando-a mais leve para enfrentar a Argentina. O jogo mais esperado do grupo A ocorreu e a Argentina livrou-se duma boa ao empatar por 0x0, em partida ruim da equipe, que deu sorte de ver a Colômbia desperdiçando várias chances. Enquanto isso, a Costa Rica surpreendeu a Bolívia, de quem se esperava uma vitória após conseguir segurar a albiceleste na estréia. Os costarriquenhos fizeram 2x0, em ótima partida do meia Campbell. Já praticamente fora, a Bolívia confirmou mais uma decepcionante Copa América ao perder para a Colômbia por 2x0, o que deixou os cafeteros com a primeira colocação assegurada do grupo. Na partida de vida ou morte, com um Messi em noite de gala, a Argentina desencantou e fez 3x0 na Costa Rica, ficando com a segunda colocação graças ao camisa 10, a Aguero, a Dí Maria e apesar de Higuaín, que perdeu diversas chances ao longo do jogo.
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Na chave B, de Brasil, Venezuela, Paraguai e Equador a primeira rodada simplesmente não teve gols. A Venezuela segurou o Brasil no primeiro tempo, enquanto no segundo a seleção verde-e-amarelo atuou mal demais; e Paraguai x Equador protagonizaram um jogo de nível técnico abaixo da crítica. Na segunda rodada, o Brasil safou-se da derrota ante o Paraguai no último lance da partida, graças a um gol de Fred nos acréscimos, que decretou o 2x2, o terceiro empate em três jogos do grupo. Quem quebrou essa sina de resultados iguais foi a Venezuela, que venceu por 1x0 o Equador com um chutaço de González. Na última rodada, perigando até ficar de fora na primeira fase, o Brasil mostrou a que veio e fez 4x2 na decepcionante seleção equatoriana, dois gols de Pato, dois de Neymar, dois de Caicedo e duas falhas do Júlio César. No outro jogo, a partida mais emocionante da primeira fase. A Venezuela abriu o placar logo aos 4 minutos de jogo com Rondón. O Paraguai fez 3x1 com Alcaraz, Barrios e Riveros. Aos 44 do segundo tempo, Fedor descontou. Para a surpresa de todos, Perozo, aos 47, empatou. Um 3x3 inesquecível, que deixou a Venezuela em segundo no grupo e o Paraguai dependendo da repescagem para sobreviver.
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Na chave C, de Uruguai, Peru, Chile e México ( outra que mandou seleções de base para a Copa América ), o favorito decepcionou nos primeiros jogos. O Uruguai ficou no empate de 1x1 contra o Peru, enquanto o Chile, após ver os jovens mexicanos saírem na frente, foram buscar a virada por 2x1 com Paredes e Vidal. Uruguai e Chile, no jogo mais forte da chave, ficaram no 1x1, com gols de Álvaro Pereira para a celeste que começava a ficar ameaçada, e Sánchez, belíssimo jogador agora do Barcelona, para os andinos. Fazendo o dever de casa, o Peru bateu o México por magros 1x0 e ficou com a classificação encaminhada, mesmo perdendo para o Chile nos acréscimos, por 1x0. Já o Uruguai, que precisava duma vitória, jogou muito melhor que o México mas só fez 1x0, gol novamente de Álvaro Pereira.
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Graças ao estranho regulamento da Copa América, apenas quatro seleções são eliminadas na primeira fase, indo 8 para os mata-matas. Sobrou para as lanterninhas do grupo ( Bolívia, Equador e México ) e para a pior terceira colocada Costa Rica, mesmo sem perder nenhuma partida na Copa América.
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Nas quartas-de-final, pode-se dizer que as quatro partidas foram surpreendentes. No confronto entre as duas maiores vencedoras da Copa América, Argentina e Uruguai fizeram um grande jogo com várias boas chances. Encerrada a prorrogação com 1x1, com gols de Higuaín, que desencantou, e Pérez, Muslera ( em grande noite ) defendeu a cobrança da Carlos Tévez, que selou a classificação do Uruguai para enfrentar o Peru, que surprendeentemente tinha eliminado a Colômbia, melhor seleção da competição na primeira fase. O jogo foi 2x0, com direito a um golaço de fora da área de Lobatón.
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Na outra chave, o domínio brasileiro do jogo mostrou-se inútil contra o goleiro Justo Villar, que pegou até pensamento e deixou a partida empatada em 0x0. Nos pênaltis, o Brasil perdeu 4 cobranças pelas primeira vez na história ( a primeira, de Elano, de maneira bizonha ) e viu o Paraguai converter duas das três cobranças, com Estigarribia e Riveros. No único jogo da fase que não precisou de prorrogação, a Venezuela surpreendeu o Chile ao vencer por 2x1, gols de Vizcarrondo e Cichero para a Vinotinto e Suazo, que desencatava tarde, para a Roja. Com isso, a seleção venezuelana chegava pela primeira vez a uma semifinal de Copa América.
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Nas semifinais, curiosamente, duas partidas que já haviam sido realizadas na fase de grupos. O Uruguai vingou o empate ante o Peru na primeira fase ao vencer a seleção albirroja por 2x0, dois gols de Luis Suárez, em jogo tranquilo para a seleção charruá. Já Paraguai e Venezuela empataram novamente, graças novamente a Justo Villar e ao azar venezuelano, que colocou três bolas na trave paraguaia ao longo do jogo. Villar defendeu a cobrança de Lucena, que colocou o Paraguai na decisão.
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Os dois últimos jogos, diferentemente das demais partidas da Copa América, tiveram muitos gols. Peru e Venezuela, que decidiram o terceiro lugar, fizeram um jogo franco e sem muita preocupação, o que levou a partida ao placar de 4x1, com direito a hat-trick do artlheiro peruano Guerrero. Com isso, o Peru tornou-se a única seleçãoa fazer 4 gols numa só partida da Copa América, e o próprio Guerrero foi o único jogador a fazer três gols num só jogo.
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Após fazer história ao chegar na final da Copa América sem ganhar uma partida, o Paraguai sucumbiu ante o bom futebol, a tradição e a raça do Uruguai. O Monumental de Nuñez foi o palco da conquista do 15º título da celeste olímpica na Copa América, com um categórico 3x0 que não deixa mentir sobre qual foi a melhor seleção do torneio. Logo aos 2 minutos, Lugano e Coates só não fizeram gol pois o zagueiro paraguaio Ortigoza abraçou a bola, em lance não visto pelo juiz. Aos 12, não teve jeito: Suárez limpou Verón e chutou, abrindo o marcador. No fim do primeiro tempo, após passe de Arévalo Ríos, Diego Forlán emendou um chutaço e desencantou, fazendo seu primeiro gol na Copa América, o segundo da seleção charruá na partida. Após um segundo tempo de sufoco do Paraguai, querendo começar a correr átras do prejuízo ( em vão ), o Uruguai encaixou um ataque mortal aos 44 do segundo tempo, que culminou com outro gol de Diego Forlán. Com a conquista, o Uruguai torna-se hegemônico em continente sul-americano, deixando a Argentina para trás e sagrando-se mais vencedor da Copa América em toda a história.
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Essa Copa América de 2011 teve, de fato, um nível técnico baixo e poucos gols, mas teve a vitória do coletivo e do trabalho longo e bem feito, já que as duas seleções finalistas eram as que mais tempo tinham com o seu treinador. O Uruguai voltou a ser grande, Paraguai, Peru e Venezuela conseguiram resultados honrosos, Colômbia e Chile decepcionaram e Brasil e Argentina precisarão rever seus conceitos caso queiram continuar a ser potências até mesmo continentais. Teve seus poréns, mas a Copa América não deixou de ser uma grande festa.